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Alerta laranja e o peão de Bobby Fischer

Opinião

Budapeste, 15h30 de 1 de dezembro de 2001

 

Atravessando a Ponte da Liberdade (Szabadság Hid - dito num húngaro sofrível) e deixando para trás o Gellert Hotel mergulhado em Arte Nova e hordas de turistas chineses que não conseguem perceber porque se chamam turcos os banhos, chegamos a uma pequena praça chamada Fõvám Ter.

Aí, se decidirmos bem e não optarmos, desta vez, pela “less traveled road”, viramos à esquerda e entramos na Váci Útca. É como mergulhar num outro século, mas em apneia. Temos de ignorar alguns arcos dourados que nos prendem ao presente, porque preguiçosamente gostamos de mastigar pequenos bifes circulares de carne moída.

Numa esquina desta rua, com uma perpendicular que aponta ao Danúbio, fica a Jövo, antiquário secular, que vai agora na 5ª geração de uma família polaca que aí se instalou no final do séc. XIX.

Despertou-me a atenção uma arca - usada é eufemismo - semi-aberta. Uma placa de lousa, escrevinhada a giz dizia:Tudo a 50 forints.

No meio de dezenas de peças, que seguramente eram somente velhas e não antigas, estava um pequeno peão de xadrez, amarelecido e gravado na base. BF. Duas simples letras que de início não despertaram qualquer reação em mim.       

Não sei se o facto de viajar há algum tempo pelo leste da Europa, ou se um artigo que lera recentemente sobre a guerra que agora é morna, aceitei que aquele peão não era outro senão o de Bobby Fischer.

Bobby Fischer percorreu o caminho entre a genialidade e a loucura num curtíssimo espaço de tempo, mas não sem antes derrotar o russo Boris Spasky, conquistando o título mundial de Xadrez. Em plena Guerra Fria, 1972, em Reiquejavique, este encontro assumiu uma dimensão muito mais política do que desportiva.

Quando o mundo se começou a habituar às suas excentricidades, fez o lance mais surpreendente de toda a sua vida: Desapareceu.

Entretanto, mais de duas décadas depois, alguém sente a mesma vontade de desaparecer, mas esconde-o.

 

Lisboa, 7 de novembro de 2023

 

O silêncio no parlamento era constrangedor. Nunca um substantivo tinha assumido tão rapidamente o caráter adjectivante. O Partido era agora quebrado, estilhaçado, dividido e despedaçado. De repente, o bombordo era um mau bordo.

Numa tarde como a desse dia, quente, húmida e alaranjada de um alerta, é inevitável não achar que alguém deva também desaparecer. Não por 20 anos como o Bobby Fischer, mas recomenda-se um período mínimo de razoabilidade.

Recomenda-se igualmente um Valium, ou a noite será longa de insónias. Em alternativa poderá dormir como um bébé … acordando de 2 em 2 horas a chorar.

 

Aveiro, dias de hoje.

 

Ilustres e notáveis concelhios dão a cara e o corpo por alguém que é bípede apesar do apelido.

 

Enquanto outros lustrosos e não tão notáveis distritais dão a cara e as intenções por santos, que como sabemos proverbialmente, sendo da casa, não fazem milagres.

Principalmente se lhe derem muitas asas.

 

Estou com sede.

O Gin pode ser Monkey 47. Sem twist de laranja… se possível!

Ílhavo Publicidade

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4 Comentário(s)

marta marques
18 dez, 2023

muito bom! obrigada

rosafonseca1957@gmail.com
17 dez, 2023

que texto!! fantástico!

tiago
17 dez, 2023

qualidade, qualidade e mais qualidade! qualidade de escrita impar e se derem asas a este escritor...

pedro silva
16 dez, 2023

extraordinário. és um verdadeiro achador de cidades e de rostos. muitos parabéns

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