Estamos em contagem decrescente para a primeira semifinal do Festival da Canção 2024 onde os Perpétua marcarão presença. Convidada para participar no histórico concurso televisivo que, este ano, celebra 60 anos, a banda da Gafanha da Nazaré (Ílhavo) sobe a palco já no próximo sábado, dia 24 de fevereiro, com “Bem Longe Daqui” – com influências de pop urbano à moda japonesa, o tema dá indicadores interessantes sobre o novo álbum que o quarteto está a preparar. Ao todo, estarão 20 canções a concurso – 14 por convite da RTP e as restantes 6 apuradas entre mais de 800 candidatas à livre submissão – distribuídas por duas semifinais. Como sempre, o vencedor representará Portugal no Eurovision Song Contest que, este ano, se realiza na cidade de Malmö, na Suécia.
Ainda era verão quando os Perpétua – Beatriz Capote, Diogo Rocha, Rúben Teixeira e Xavier Sousa – foram surpreendidos com o telefonema de um Bernardo Limas em lágrimas. O manager tinha acabado de receber o convite da RTP para os Perpétua participarem na edição de 2024 do Festival da Canção. “Não estávamos, de todo, à espera do convite. Se calhar, até já tínhamos pensado sobre a possibilidade de submeter uma canção ao Festival, mas nunca fizemos nada para que isso pudesse, de facto, acontecer”, conta Beatriz. “E não íamos, certamente, fazê-lo para o ano de 2024”, assegura.
Se, por um lado, o convite lhes trouxe generosas doses de confiança e entusiasmo, por outro, também veio acompanhado de nervosismo e inquietação. “Todos nós temos outras ocupações profissionais, mas percebemos que tínhamos de nos concentrar bastante nos Perpétua porque tínhamos este novo grande objetivo a cumprir”, diz Beatriz, que entende a participação no Festival da Canção como “a maior conquista” da banda até ao momento. “É um grande orgulho poder estar no palco por onde passaram tantos grandes artistas. Não podíamos estar mais orgulhosos. Quem sabe o que virá a seguir”. “É, de facto, a maior mostra de música portuguesa. Esperamos que muita gente que não nos conhece possa descobrir a nossa música”, acrescenta Diogo.
Em todo o processo de preparação para o Festival, a “maior dificuldade”, reconhece Rúben, “tem sido conciliar a participação no Festival com a produção do nosso segundo álbum”. “Quando recebemos o tal telefonema do Bernardo a dizer que os Perpétua iam estar no Festival, já tínhamos o novo álbum imaginado e programado para acontecer este ano e nunca esteve sequer em cima da mesa atrasarmos o lançamento. Encarámos, desde logo, a nossa ida ao Festival como mais um motivo para termos o novo álbum este ano”. Se “Esperar Pra Ver” – com o qual a banda se estreou, em 2021 – era “uma mistura de vários estilos”, o novo álbum será “mais direcionado para o disco e para os seus subgéneros, como o city pop”, explica Beatriz. A forma mais fácil de colocar esta questão é, no entender de Rúben, dizer que o segundo álbum dos Perpétua “virá na continuidade do que vamos levar ao Festival” até porque, inicialmente, “Bem Longe Daqui” era para constar do próximo longa-duração.
“Sinceramente, não me lembro quando é que a ‘Bem Longe Daqui’ surgiu. Sei que a fiz e que, inicialmente, era composta com vocalizos japoneses”, introduz Xavier. “Ainda temos essa versão”, alerta Diogo, deixando no ar a possibilidade de, um dia, o tesourinho poder vir a público. “A letra – aliás, uma primeira versão da letra - só apareceu um ano depois, inspirada numa experiência de separação”, continua o baixista. “Quando decidimos que íamos levar esta música ao Festival, acabámos por alterar um pouco a letra original. Quisemos dar-lhe alguma ambiguidade para que cada pessoa pudesse interpretá-la como entendesse”, esclarece Diogo, referindo-se ao poema final que, mesmo para os membros da banda, “significa coisas diferentes”. “E ainda fizemos outras adaptações”, recorda Rúben. “Por exemplo, a versão original tinha quatro minutos – o regulamento do Festival da Canção impõe uma duração limite de três minutos – e um solo”. “Tenho tanta pena que o solo não tenha ficado”, lamenta o manager Bernardo Limas. “É uma novidade que queremos apresentar ao vivo”, continua o baterista, antevendo que, passado o Festival, quem assistir a um concerto de Perpétua possa ser arrebatado com uma versão alargada de “Bem Longe Daqui”. De acordo com Xavier, recuperando os primeiros passos do processo criativo que deu lugar à canção, outra das ideias para o futuro é encontrar um intérprete nipónico que grave com eles uma versão em língua japonesa.
Desde que se deram a conhecer como banda que os Perpétua defendem a descentralização da cultura, afirmando uma identidade que, em grande parte, passa pelo território a que chamam casa. Uma causa pertinente e relevante que, no caso dos Perpétua, não se limita a habitar-lhes o discurso. Concretiza-se nas opções que tomam, nos riscos que correm e nas consequências que assumem. Esta participação no Festival da Canção traz uma mão cheia de exemplos. “Fizemos questão de trabalhar exclusivamente com malta da região”, assume Bernardo Limas, enumerando alguns dos profissionais que têm colaborado com a banda na construção da atuação que vão levar ao Festival: no que ao cabelo e maquilhagem diz respeito, os Perpétua estão nas mãos da hair stylist Ana Vasconcelos, do Hairtz, em Aveiro, e da maquilhadora Paula d’Aquino; as roupas estão a cargo do estilista Joel Reigota, com atelier na Gafanha da Boavista, em Ílhavo; a performance em palco foi coreografada por Jonathan Margarido, da Palco Central, e os ensaios tiveram lugar na sede da Associação Extragenária, na Ponte de Vagos. “A RTP deu-nos um bocadinho na cabeça porque fomos atrasando o processo de construção, mas para nós era importante fazer as coisas com cabeça. A música é o núcleo e depois foi necessário ir acrescentando camadas. Quisemos ter connosco pessoas que se revissem nesta nossa bandeira de descentralizar a cultura e que nos ajudassem a mostrar que se fazem coisas muito boas para lá de Lisboa”, sublinha Bernardo.
Nesta ânsia de levar consigo toda uma região, nas últimas semanas, os Perpétua têm andado a distribuirflyers onde apelam ao público para que ouça a sua canção, esteja atento ao Festival e ajude a banda a alcançar a final. A reação tem sido “calorosa”. “Ainda no outro dia, na Gafanha, fomos abordados por alguém que nos dizia ter acabado de ouvir a nossa música no Facebook e por outra pessoa que nos perguntava se éramos ‘aqueles que vão ao Festival da Canção’. É mesmo bom sentir que as pessoas da nossa terra acreditam que vamos fazer um bom trabalho”, realça Beatriz.