A atualidade é marcada pelo abandono dos ideais universais do Iluminismo. Os elevados decibéis das redes sociais contaminam as televisões generalistas e o discurso político. Os populistas defendem sem qualquer moderação uma visão nacionalista em que uma determinada “tribo” é necessariamente melhor do que outra. Nunca se explica muito bem o que distingue uma comunidade em detrimento de outro povo. Depreende-se um qualquer determinismo “genético”. Um destino inevitável e escrito nas estrelas.
Ignoram assim a complexidade da história social e política das nações. Escolhem não aprender com a ciência, que provou sermos todos da mesmíssima espécie.
Para tentar rebater alguns dos argumentos acima vale a pena citar um exemplo concreto em que as circunstâncias geopolíticas ditaram condições de vida absolutamente distintas.
O povo coreano está unido pela sua história comum milenar, mas atualmente encontra-se dividido em dois territórios.
A Coreia do Norte é um dos regimes mais fechados do mundo e quem lá vive está sob o jugo autocrático da família Kim.
A Coreia do Sul é uma democracia com forte dinamismo económico e tecnológico. É um país inclusivo e com crescentes conquistas de amplos direitos das mulheres. Os seus filmes, séries e música K-pop são admirados por muitos.
O caso dos edifícios Lotte Word Tower, na Coreia do Sul, e o Hotel Ryugyong, na Coreia do Norte, também serve para ilustrar as diferenças de desenvolvimento real entre as duas coreias.
O Lotte é o edifício mais alto da Coreia do Sul e tem variadas lojas de moda, cinemas e o maior aquário do país. Em contraste, o piramidal Ryugyong, no Norte, permanece inacabado, esquecido ou usado em poucas ocasiões, tendo sido até removido das fotografias oficiais do regime.
Não há, portanto, nada que distinga geneticamente um bebé norte-coreano de um sul-coreano. Mas o seu futuro será certamente diferente devido a alguns momentos cruciais: ocupação japonesa, independência tardia e divisão potenciada pelo xadrez da Guerra Fria.
Todos os pormenores deste trajeto estão descritos no livro “Coreia - uma breve história do Norte e do Sul” de Victor Cha e Ramon Pardo. Os autores são profundos conhecedores da península coreana e conseguiram descrever de forma acessível a evolução das diferentes comunidades até à atualidade. Terminam o livro com a esperança numa reunificação reconciliadora e pacífica.
Esta obra notável pode servir de mote para o regresso aos direitos universais e à certeza de que, apesar de imperfeitas, as democracias liberais são o modelo que cria mais riqueza e oportunidades e que permite viver em verdadeira liberdade.