No dia 16 de outubro de 1924, houve uma cisão na banda de Casal de Álvaro, em Espinhel (Águeda). A maioria dos músicos e o próprio maestro, Ludgero Pinheiro, abandonaram a associação e rumaram a Travassô, de onde eram originais, para aí criarem a Sociedade Recreativa e Musical, mais tarde conhecida por Orquestra 12 de Abril – foi nesta data, em 1925, que se deu a primeira atuação da nova banda.
Na próxima quarta-feira, precisamente no dia em que se assinalam 100 anos desde esse momento de separação, mais de 120 músicas das duas instituições sobem ao palco do Centro de Artes de Águeda para um concerto conjunto que marca o arranque das comemorações do centenário da banda de Travassô. Nuno Amorim, presidente da direção da Banda Alvarense, e Hélder Pires, presidente da direção da Orquestra 12 de Abril, esperam um espetáculo histórico, tal como o momento que ele evoca.
“Há 100 anos, só existia a Banda Alvarense”, introduz Nuno Amorim – a Sociedade Musical Alvarense, mais conhecida por Banda Alvarense, havia sido fundada a 25 de agosto de 1905. “No entanto, precisamente no dia 16 de outubro de 1924, o maestro e mais de metade dos músicos abandonaram a banda”, prossegue o dirigente, explicando que, “como eram quase todos de Travassô, chegaram à conclusão de que deviam formar uma banda na sua terra”.
Hélder Pires, por seu turno, suspeita que algo mais possa ter acontecido. “Ninguém sabe o que, verdadeiramente, terá motivado aquela separação. Não há nada escrito sobre isso. Mas, obviamente, não terá sido por uma desavença menor ou um problema isolado. Não foi, com certeza, de ânimo leve que a maioria dos músicos e o maestro desertaram. Ter-se-á devido, seguramente, a uma série de situações graves”, expõe o dirigente, confirmando que “o facto de serem de Travassô também pode ter pesado na decisão”. “Porquê andar com a bandeira de outra terra quando podemos andar com a nossa?”, comenta. Outro motivo, supõe Hélder, pode ter sido o “cariz muito republicano” da Banda Alvarense, em oposição ao “movimento pró-monárquico” que se vivia em Travassô naquele período instável da Primeira República. “Repare-se que a Banda de Travassô adotaria o azul e branco [cores tradicionalmente associadas à monarquia portuguesa], assumindo o contraste com a bandeira vermelha [cor revolucionária e ardente, a mesma da bandeira da causa republicana] da Banda Alvarense”.
De acordo com Hélder Pires, “no início, as relações [entre as duas instituições] eram péssimas, mas com o passar do tempo foram melhorando”. “É um pouco como os clubes de futebol. Se, por vezes, o clube da terra tem de defrontar o clube da terra vizinha, cria-se sempre uma certa rivalidade. E isso também acontece nas bandas. Ainda hoje, quando duas bandas participam na mesma festa, estão numa espécie de ‘duelo’ uma com a outra”, compara. “Só começou a haver um verdadeiro entendimento depois da fundação, em 1988, da UBA – União de Bandas de Águeda –, que reúne todas as bandas do concelho à mesma mesa”. “A partir do aparecimento da UBA, todas as rivalidades existentes - não só entre a Banda Alvarense e a 12 de Abril, mas também entre as várias bandas do concelho – acabaram por se atenuar”, confirma Nuno Amorim.