Mais do que formar novos profissionais, o Departamento de Ambiente e Ordenamento da UA é também berço de importantes projetos de investigação. É também lá que está a génese do IDAD –Instituto do Ambiente e Desenvolvimento, que presta apoio às empresas e à administração pública na busca das melhores soluções de inovação ambiental. A pretexto da edição comemorativa do seu 6º aniversário, a Aveiro Mag conversou com Fátima Lopes Alves, diretora do Departamento de Ambiente e Ordenamento da UA e diretora do Instituto do Ambiente e Desenvolvimento (IDAD).
O ambiente e a sustentabilidade estão hoje na ordem do dia, mas nesta instituição há muito que eles são uma prioridade. Há quantos anos foi criado o Departamento de Ambiente e Ordenamento da Universidade de Aveiro?
Foi criado há 47 anos. O professor Carlos Borrego, mais tarde ministro do Ambiente, foi pioneiro quando, a seguir ao 25 de Abril cria, nesta universidade, a primeira licenciatura em engenharia do ambiente, do país. Dois anos mais tarde, após a criação do Departamento de Ambiente, surge a visão estratégica de que as questões do ambiente estão intimamente ligadas à sustentabilidade territorial. Por isso, este departamento foi designado como ambiente e ordenamento. Falar de ambiente sem falar de pessoas, do território e do planeta em si, não fez sentido, no passado, e muito menos atualmente. Houve, por essa razão, na sua criação duas licenciaturas: a de engenharia do ambiente e a de planeamento regional e urbano.
Nessa altura, provavelmente, nem existiriam muitas mais no país...
Nem de uma, nem de outra. Foi há quase 50 anos. No início, na década de 70, quando se falava em ambiente, as questões que se colocavam estavam muito ligadas à resolução das dos problemas de poluição da água, do ar, dos solos e à procura de soluções. Mas a palavra ambiente acabou por tornar-se muito mais abrangente e, hoje, o que está verdadeiramente na ordem do dia é a sustentabilidade planetária. Já não estamos só a olhar localmente, para um problema concreto. A globalização veio trazer esta dimensão planetária, de ecossistema, a tudo o que são as áreas das ciências e da engenharia do ambiente.
Atualmente, há uma componente muito tecnológica na área da engenharia do ambiente que talvez não houvesse há 47 anos. Hoje, está muito ligada às questões da inovação, da energia e da descarbonização, à digitalização dos processos e, acima de tudo, à monitorização do que é a questão do ambiente e da sustentabilidade: temos o ar, os recursos hídricos, as florestas ou os solos menos poluídos mas a necessitar de uma maior atenção na sua gestão, enquanto recurso finito, aliada aos desafios da valorização dos recursos, da circularidade, da sua gestão. Preocupamo-nos em desenvolver soluções para a recuperação, para o suso sustentável e governança equilibrada de todos os recursos, nunca perdendo de vista o contexto global das alterações climáticas que afetam a humanidade. É pois, neste contexto à escala global, que a componente tecnológica do ambiente e da sustentabilidade sobressai, nos dias de hoje.
São 47 anos a ensinar, a formar, mas também a fazer investigação...
Muita investigação. Neste momento, temos 35 investigadores, mas é importante passar a mensagem de que a questão do ambiente e da sustentabilidade é tão transversal na investigação que temos neste momento membros integrados de quatro unidades de investigação no departamento. A maior parte dos docentes e investigadores pertence ao CESAM (Centro de Estudos do Ambiente e do Mar), temos também docentes investigadores ligados ao TEMA (Centro de Tecnologia Mecânica e Automação), e temos também docentes e investigadores ligados à unidade da GOVCOPP (Governança, Competitivade e Políticas Públicas) e igualmente ao GEOBIOTEC (GeoBiociências, Geotecnologias e Geoengenharias), muito ligado às questões dos solos. Portanto, é um departamento que tem uma grande pluridisciplinaridade ao nível da investigação e do conhecimento que desenvolve. Daí estas quatro unidades trabalharem em conjunto e com muitas parcerias entre os seus docentes e investigadores.
Que tipo de projetos estão aqui a ser desenvolvidos? É possível ter alguns exemplos?
Temos vários projetos, pois abrangemos a componente do ar, da água e dos solos. Temos dois projetos muito interessantes ligados aos solos e em que Portugal até foi pioneiro: um deles, é o CURIOSOIL focado no ensino, com mais de 20 parceiros e mais de 5 milhões de euros de financiamento da União Europeia. A coordenadora principal é uma docente deste departamento – Sónia Rodrigues. Um segundo projeto financiado pela Comissão Europeia é coordenado por um investigador do DAO – Jacob Keizer, cujo objetivo é a adoção generalizada de inovações tecnológicas, sociais e baseadas na natureza para prevenção e restauração da degradação dos solos. A área da recuperação e da qualidade dos solos, e também do ensino do que é o solo, há muito que se desenvolveu aqui, retomando agora a prioridade por parte da Comissão Europeia. E o Departamento de Ambiente e Ordenamento da UA soube responder a a esta necessidade e com elevado sucesso!
Uma outra área forte do departamento é a da valorização dos resíduos, com os projetos ligados ao biometano e biomassa, hidrogénio. Sâo disso exemplo o projeto BioValChar e diversos projetos financiados no âmbito do PRR através das Agendas Mobilizadoras.Com esta investigação, um resíduo transforma-se num subproduto, com valor associado a uma reutilização, na dimensão da circularidade.
Temos também a área da qualidade da água e do planeamento e gestão dos recursos hídricos. Não só no que à qualidade diz respeito, mas também ao nível do abastecimento e uso da água. Temos um conhecimento muito aprofundado a esse nível, fruto de várias décadas de investigação e transferência de conhecimento consolidado.
Outra área em que temos projetos é da poluição e da modelação da qualidade do ar. O GEMAC (Grupo de Emissões, Modelação e Alterações Climáticas) é também um grupo forte na investigação e de consultoria especializada que tem feito diversos trabalhos para a administração, pública e privada, no que diz respeito à qualidade do ar, modelação e alterações climáticas
Este departamento foi e é casa de vários docentes que foram chamados a exercer cargos públicos de gestão da administração e do setor empresarial do estado.
Portanto, aqui não se estuda e investiga apenas na área do ambiente e do ordenamento...
Verdade. Um dos nossos mestrados é em ambiente e saúde. Temos a licenciatura em engenharia do ambiente e depois temos quatro mestrados: um deles é o de ambiente e saúde, que está no segundo ano. Foi uma grande novidade e surge também por causa das grandes valências que a UA tem e agora reforça na área da saúde.
Temos outro mestrado ligado à gestão ambiental, às ETARs e efluentes. Também o mestrado em sistemas energéticos sustentáveis, que é ligado às energias renováveis e descarbonização e temos aqui uma equipa já a dar cartas em projetos internacionais nestas matérias. E temos também uma área que sempre foi aqui muito acarinhada, e continua a ter um reconhecimento internacional muito grande, que é a gestão integrada das zonas costeiras. Fomos pioneiros, há cerca de 25 anos, com o projeto ESGIRA-MARIA na Ria de Aveiro (Estrutura de Gestão Integrada da Ria de Aveiro), foi o primeiro projeto sobre gestão integrada nas zonas costeiras financiado pela Comissão Europeia e nessa altura criou-se aqui um grupo de investigação e de transferência de conhecimento muito grande. E continuamos a trabalhar muito nessa área, nomeadamente na área do ordenamento e gestão do espaço marítimo.
São chamados por muitas empresas e instituições para fazer projetos de investigação?
Uma das missões da UA é essa transferência de conhecimento para o setor público e privado. Por um lado, no âmbito do ensino e formação – e temos um programa doutoral aqui no departamento, já há muitos anos, em território, risco e políticas públicas, em parceria com a universidades de Coimbra e Lisboa -, e o programa doutoral em ciências e engenharia do ambiente. Ao nível da prestação de serviços à comunidade, seja a empresas, câmaras municipais ou a grandes instituições e organismos da administração pública e privada, há um reconhecimento robusto e consistente de longa data, do que melhor se faz neste departamento sobre ambiente e sustentabilidade.
Se há uma ou duas décadas estávamos mais vocacionados para prestar estes serviços aos organismos da administração pública, hoje em dia, a preocupação da inovação para resolver os problemas tem uma base tecnológica mais acentuada. Portanto, temos agora uma relação muito intensa com as empresas. E nestas agendas mobilizadoras financiadas pelo PRR temos tido parcerias com empresas de grande dimensão não só a nível regional, mas também a nível nacional e internacional. A nível regional, trabalhamos com CCDR Centro, o Porto de Aveiro, assim como empresas como a Bondalti, Prio, Adra, entre outras. Mas isto é um trabalho que temos vindo a fazer há muitos anos e que ajuda a explicar a criação do IDAD e a ligação ao departamento e universidade.
Há quantos anos surgiu o IDAD?
Foi criado há cerca de 30 anos, por iniciativa do professor Carlos Borrego. Havia uma necessidade de as universidades terem uma unidade de interface entre a academia e as empresas e instituições e o IDAD surge para fazer, precisamente, essa ligação entre o “saber” e o “fazer” das empresas, indústrias e da administração. O IDAD foi-se desenvolvendo prestando serviços, aglutinando o saber que havia na universidade, não só neste departamento, mas também noutros, mediante as necessidades de quem procurava, na universidade o conhecimento científico e também técnico. Se estivéssemos, por exemplo, a falar na necessidade de fazer um plano de monitorização da qualidade do ar, obviamente que o departamento tinha investigadores e docentes a trabalhar para esse projeto. Mas se fosse, por exemplo, algo relacionando com a localização de uma exploração de terras, também teríamos de ir buscar o departamento de geociências, por causa da questão dos solos.
O IDAD teve visão e capacidade de ser uma unidade de interface que agrega conhecimento dos vários departamentos na prestação de serviço e na transferência de conhecimento. Mas não concorre com as unidades de investigação que também o fazem em áreas de ponta e mais diversificadas
E são muitas vezes chamados a fazer essa prestação de serviços?
Somos. O Departamento de Ambiente e Ordenamento sempre teve uma procura significativa na prestação de serviços e transferência de conhecimento. Talvez pela formação, ensino e a investigação que aqui se faz tenha permitido o reconhecimento e destaque de vários docentes do departamento, tenham sido convidados para lugares de relevo nas áreas do ambiente e gestão do território e infraestruturas, cargos públicos de grande importância na formulação e implementação das políticas públicas.
E isso orgulha-vos...
Muito. Também da universidade a nível global tivemos ministros, como foi o caso dos professores Carlos Borrego e Júlio Pedrosa. Mas ao nível de um departamento de dimensão média, é de destacar terem saído daqui mais de seis gestores públicos de várias áreas.
Voltando ao IDAD, estamos a falar de uma equipa numerosa?
O IDAD é uma associação sem fins lucrativos de cariz técnico e científico. Tem neste momento 13 funcionários, uma administrativa e 12 técnicos superiores das áreas das ciências e engenharia do ambiente e sistemas de informação geográfica, e tem um volume de faturação anual significativo e robusto. Esta equipa de funcionários são o “core” do IDAD. São muito treinados, altamente especializados, com um conhecimento de décadas na área da consultoria às empresas, quer na área da avaliação ambiental, quer na área da qualidade do ar e das águas e ainda da sustentabilidade. Temos clientes muito antigos, como a Lipor, a Bresfor, a Agência Portuguesa do Ambiente (público e privados) empresas e individuais várias câmaras municipais, que vão desde Loures a Viana do Castelo.
O IDAD foi-se especializando, de alguma forma, olhando para o mercado e percebendo do que ele precisava. Estamos a falar de solicitações para fazer a monitorização e medição da qualidade do ar nas emissões das fábricas. Também ao nível dos odores, onde nos especializamos, estamos a ter uma procura significativa pois somos certificados nesta componente hoje muito procurada e necessária. Atualmente, só há dois equipamentos para medição dos odores e o: IDAD tem um deles.
Temos a área dos estudos relacionados com a avaliação de impacte ambiental e as avaliações ambientais estratégicas, área na qual o IDAD sempre foi muito forte, tanto é que fez parte da equipa que fez o estudo do novo aeroporto e esteve sempre muito ligado aos planos da orla costeira. Outra área, é a da qualidade do ar, em que somos muito solicitados e que constituiu uma área core dos serviços prestados pelo IDAD, no setor empresarial nacional. Atualmente, a área da sustentabilidade tem vindo a crescer no setor empresarial, decorrente das obrigações legais no que diz respeito à integração da componente da sustentabilidade nos seus relatórios de gestão. O IDAD tem claramente competência nesta matéria e possui uma equipa de especialistas dedicados a apoiar as empresas nesta matéria.
